quarta-feira, 27 de janeiro de 2016


A HISTÓRIA REPETE-SE SEMPRE, PELO MENOS DUAS VEZES


A presente imagem, retirada do semanário ilustrado Branco e Negro, de 26 de Abril de 1896, captando o momento de paragem e descanso dos setenta e dois ciclistas, sócios da associação lisboeta ‘Velo-Club’, no seu organizado e empreendido primeiro passeio oficial a Queluz faz-nos pensar que passados 120 anos a moda da “bike” e do circuito ciclístico domingueiro, pelas estradas dos arrabaldes de Lisboa, não é, afinal, tão original como fenómeno de época, como se pretende que seja.
 
Segundo a mesma notícia, também este evento de manifesta expressão física, de um grau de dificuldade inerente ao esforço praticado e reconhecido no propósito do seu percurso – admitimos nós, efectuado por caminhos sinuosos e acidentados, irregularmente empedrados ou de macadames esburacadas –, apresenta-se como uma realização de salutar registo e de grande incremento na sociedade portuguesa. Aliás, ignorando-se o elemento de diferença tecnológica e o seu factor de conforto decorrente, existente entre as ‘máquinas’ e os ‘equipamentos acessórios’ das duas épocas, o obstáculo da prática da actividade ciclística consegue ser comparável às actuais dificuldades impostas a quem a pratica hoje por percursos de “todo-o-terreno” ou palmilhando os infindáveis quilómetros de alcatrão, numa partilha forçada de faixa de estrada e de perigos decorrentes. E isto, não esquecendo que, então, as maiores preocupações ambientais seriam evitar-se as bostas deixadas pelos animais, enquanto, agora, nestes tempos de modernidades circulantes, há que pensar nas inconveniências das sucções dos fumos saídos dos tubos de escape.
Paralela e independentemente da passagem do tempo, mantém-se um ponto final convergente na organização destas marchas, honradamente documentados como acto de dedicação, propósito e vivacidade de actividade: tudo finda num bom, demorado e regado almoço.
 
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Três números depois, a revista Branco e Negro, agora de 17 de Maio, volta a abordar o assunto dos exercícios da educação física que estão a ser incrementados na sociedade portuguesa. Desta vez pegando num ‘passeio de andarilhos’, também ele iniciado em Lisboa e com términus junto ao Palácio de Queluz.
Apesar de não ter havido uma participação significativa – afirmando-se na reportagem ser incompreensível a razão da limitada aderência em virtude de ter havido um prévio acordo de associações –, a actividade reuniu trinta e seis ‘rapazes’ que vestidos com o vestuário apropriado e calçados de alpercatas brancas de sola de cortiça, percorreram o longo percurso, iniciado em Lisboa pelas seis e trinta da manhã, de uma forma rápida e sem percalços, chegando a Queluz na ‘melhor disposição de espírito e de corpo’.
Também aqui, e em proveito de oportunidade, somos de admitir que estes andarejos de finais do século XIX têm em fundamento e objectivo as mesmas razões que as actuais actividades de passeios pedestres.
Na realidade, em leitura de pensamento hegeliano, ‘A HISTÓRIA REPETE-SE SEMPRE, PELO MENOS DUAS VEZES’.
 

 

Eugénio Montoito

Baleia. 27 de Janeiro de 2016

 

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