quinta-feira, 28 de janeiro de 2016


ERICEIRA

 

Vista através do escrito de J. F. Henrique Nogueira, publicado no ‘Jornal Literário e Instrutivo da Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis’, “O Panorama”, de 26 de Outubro de 1844 [2ª Série, Vol. III, nº 148, p.335].

 
«A Vila da Ericeira, situada na costa do Oceano três léguas ao Norte de Sintra e uma e meia ao Poente de Mafra, é uma povoação de antiga data e quase toda habitada por homens dados ao trato marítimo.
El Rei D. Afonso IV lhe deu Foral em 17 de Maio de 1369, e posteriormente D. Manuel o reformou em 1513. Em documentos antigos é conhecida por Oyriceira e Eyriceyra. E daqui vêm ser as armas do Concelho um ouriço. Consta que primeiramente pertencera à Paróquia de Mafra. Os mais antigos assentos da separação são de 1406. A actual freguesia é da invocação de S. Pedro e foi edificada nos princípios do século passado, prestando auxilio o Sr. D. João V.
O estabelecimento mais importante que esta Vila possui é a Casa da Misericórdia, a qual foi fundada, onde havia uma ermida do Espirito Santo, por Francisco Lopes Franco em 1678. Este doou-lhe um padrão de juro de 480:000 Reis, e os pescadores obrigaram-se a pagar-lhe anualmente todo o ganho de uma rede de pesca, cujo ónus solveram pela quantia de 6:400 Reis que ainda hoje pagam cada um dos dez barcos de pesca. O rendimento actual em juros e foros é de Rs. 1:679$700. Despende com encargos pios e despesa do culto 725$300, e com o hospital 479$300. O excedente da receita é empregado em esmolas e vestuário aos pobres.
Os habitantes empregam-se pela maior parte nas pescarias ao longo do nosso litoral, na costa de Marrocos e também já fizeram três expedições ao Banco da Terra-Nova nestes últimos anos. O número de embarcações de todos os lotes, incluindo as do comércio de cabotagem é de 98, empregando 670 indivíduos. A população orça por 2769 almas com 750 fogos; no princípio deste século tinha apenas 600.
O forte que a estampa representa está sobranceiro à calçada que dá para a praia e hoje acha-se desguarnecido. Segundo se depreende de uma inscrição sobre a porta foi edificado por D. Pedro II, em 1760.
No chafariz chamado a Fonte do Cabo existe uma pedra embutida na parede com um emblema e legenda em caracteres góticos em relevo que parece significar, Feita na Era de Mil e Quatrocentos e Cinquenta e Sete Anos.
Ainda existem restos do Palácio do senhorio desta Vila, o Conde da Ericeira: pela parte superior de algumas janelas veem-se pedras com um leão esculpido. Estas paredes, a que o povo chama o Paço, são dignas de veneração por terem servido de residência, e quem sabe se de academia, ao nosso douto escritor D. Francisco de Menezes.
A meia légua ao Nascente desta Vila está aberta uma mina de barro branco no sítio chamado a Avesseira, que já tem sido explorada por conta das fábricas de louça das Janelas Verdes e Vista Alegre.
Também por este mesmo sítio é situado o chamado Pinhal dos Frades, por ter pertencido ao Convento de Mafra. É uma importante propriedade nacional assim pelo número como pela bondade e préstimo das árvores, que excedem em diâmetro e altura as de todos os outros pinhais circunvizinhos.»
[J. F. Henrique Nogueira]
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Em percursos de leituras e releituras
MONUMENTO DE ODIVELAS
Perto do Convento de Odivelas, num outeiro junto ao caminho que vem de Lisboa, sobre o qual se estendeu a povoação de Odivelas, ergue-se um monumento que a tradição popular denomina 'Monumento de D. Dinis'.
Na diferença do suporte e numa passagem do tempo:

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016


A HISTÓRIA REPETE-SE SEMPRE, PELO MENOS DUAS VEZES


A presente imagem, retirada do semanário ilustrado Branco e Negro, de 26 de Abril de 1896, captando o momento de paragem e descanso dos setenta e dois ciclistas, sócios da associação lisboeta ‘Velo-Club’, no seu organizado e empreendido primeiro passeio oficial a Queluz faz-nos pensar que passados 120 anos a moda da “bike” e do circuito ciclístico domingueiro, pelas estradas dos arrabaldes de Lisboa, não é, afinal, tão original como fenómeno de época, como se pretende que seja.
 
Segundo a mesma notícia, também este evento de manifesta expressão física, de um grau de dificuldade inerente ao esforço praticado e reconhecido no propósito do seu percurso – admitimos nós, efectuado por caminhos sinuosos e acidentados, irregularmente empedrados ou de macadames esburacadas –, apresenta-se como uma realização de salutar registo e de grande incremento na sociedade portuguesa. Aliás, ignorando-se o elemento de diferença tecnológica e o seu factor de conforto decorrente, existente entre as ‘máquinas’ e os ‘equipamentos acessórios’ das duas épocas, o obstáculo da prática da actividade ciclística consegue ser comparável às actuais dificuldades impostas a quem a pratica hoje por percursos de “todo-o-terreno” ou palmilhando os infindáveis quilómetros de alcatrão, numa partilha forçada de faixa de estrada e de perigos decorrentes. E isto, não esquecendo que, então, as maiores preocupações ambientais seriam evitar-se as bostas deixadas pelos animais, enquanto, agora, nestes tempos de modernidades circulantes, há que pensar nas inconveniências das sucções dos fumos saídos dos tubos de escape.
Paralela e independentemente da passagem do tempo, mantém-se um ponto final convergente na organização destas marchas, honradamente documentados como acto de dedicação, propósito e vivacidade de actividade: tudo finda num bom, demorado e regado almoço.
 
***
 
Três números depois, a revista Branco e Negro, agora de 17 de Maio, volta a abordar o assunto dos exercícios da educação física que estão a ser incrementados na sociedade portuguesa. Desta vez pegando num ‘passeio de andarilhos’, também ele iniciado em Lisboa e com términus junto ao Palácio de Queluz.
Apesar de não ter havido uma participação significativa – afirmando-se na reportagem ser incompreensível a razão da limitada aderência em virtude de ter havido um prévio acordo de associações –, a actividade reuniu trinta e seis ‘rapazes’ que vestidos com o vestuário apropriado e calçados de alpercatas brancas de sola de cortiça, percorreram o longo percurso, iniciado em Lisboa pelas seis e trinta da manhã, de uma forma rápida e sem percalços, chegando a Queluz na ‘melhor disposição de espírito e de corpo’.
Também aqui, e em proveito de oportunidade, somos de admitir que estes andarejos de finais do século XIX têm em fundamento e objectivo as mesmas razões que as actuais actividades de passeios pedestres.
Na realidade, em leitura de pensamento hegeliano, ‘A HISTÓRIA REPETE-SE SEMPRE, PELO MENOS DUAS VEZES’.
 

 

Eugénio Montoito

Baleia. 27 de Janeiro de 2016

 

‘UMA PROCISSÃO EM CANEÇAS’


Retirado do semanário ilustrado lisboeta Branco e Negro, de 17 de Janeiro de 1897 [1º Ano, nº 42], inserido numa rúbrica, apenas com imagens, denominada ‘Portugal Pittoresco

(Fotografia de A.Ben-Sande)